MEMÓRIA: Longe dos gramados desde 1977, Ademir da Guia teve partida de despedida somente em 1984

Por Thell de Castro

Ademir da GuiaQueria abordar a época em que Ademir da Guia deixou o futebol, em 1977. Mas não consegui encontrar grandes fatos – ele teve problemas de saúde, ficou um bom tempo sem jogar, teve alguns empecilhos para renovar o contrato e encerrou sua carreira.

Mas o Divino só teve um jogo de despedida em janeiro de 1984, quando já tinha quase 42 anos. Trago hoje aqui uma reportagem especial de uma página da Folha de S. Paulo, assinada por Miguel de Almeida, com um perfil de Ademir da Guia, publicada no dia 15 de janeiro de 1984, alguns dias antes desse jogo.

Trago a matéria completa, que é grande, para que os palmeirenses mais jovens, como eu, que não o viram em campo, possam ter uma ideia do que perderam, e os mais antigos, que tiveram esse privilégio, possam relembrar esses tempos.

Ademir da Guia
Reprodução Folha de S.Paulo

Da Guia, ainda um menino de olhos tristes

Lá estava a fera, seis anos depois de ter abandonado o campo, não por vontade própria, e mais por uma maldita sinusite – lá estava o divino, de calção, sem camisa, voz de moleque dengoso, perto de completar 42 anos, ainda um menino de olhos tristes e verdes, talvez com a mesma aparência ingênua trazida do Bangu, bairro carioca onde nasceu. Lá estava Ademir da Guia, atrasado meia hora pra entrevista, e pedindo:

– Tem de esperar um pouco. Vou tomar uma ducha rápida.

E foi. Até os atletas padecem do calor mortal numa cotidiana tarde paulistana. Passada em um apartamento – quente – localizado nas Perdizes, bem próximo à PUC. Depois de seis anos afastado do futebol – ele saiu em setembro de 77, pensando que voltaria em seguida – Ademir da Guia deve pisar no campo da Portuguesa no dia 22 de janeiro, na pele de Seleção Paulista x Palmeiras.

Lá estava Ademir da Guia – no banho. Nada de luxo no apartamento de um homem cantado por três poetas brasileiro (João Cabral de Melo Neto, Décio Pignatari e Roberto Bicelli) – um privilégio que nem Édson Arantes do Nascimento, Pelé, teve em sua brilhante carreira (no entanto, ele tem a Xuxa: compensações).

Um sujeito de subúrbio carioca, outra lenda brasileira, incrível meio-campista, campeão 5 vezes pelo Palmeiras, acostumado às demonstrações mais carinhosas dos torcedores – e, sabemos, isso é difícil, por ser o torcedor pior do que mulher amada, sempre exigindo milagres em beiras de penhascos, além de ser a manifestação de amor mais próxima da faca de dois gumes: hoje, a glória; amanhã, nada.

O apartamento pouco tem de luxo, um equipamento de som no canto direito da sala, algumas gravuras pelas paredes, um conjunto de sofás bem simples, mesas de mármores – nada demais.

De repente, o homem. E uma lembrança também. Quando ele jogava – e como jogou – todos comemoravam seu estilo calmo e frio, feito diagnóstico, de tocar a bola. Poucos entendiam. Todos gostavam. Na verdade, Ademir da Guia é o Paulinho da Viola do futebol brasileiro – como o sambista tem de ser observado, porque não faz lances grosseiros, só percebido por pessoas demais de sensíveis, porque sutileza não acontece sempre, nem é manchete de jornal.

Ademir da GuiaLá estava o divino. De calção, sem camisa, meio largado no sofá, o admirável Da Guia foi logo dizendo:

– Me desculpe. É que me atrasei pela cidade. (A voz é pausada, os olhos soltos pela sala, jamais presos a um objetivo ou ponto definido). Sabe, ando até meio cansado. Quando você tá nessa vida de jogador, dá uma entrevista hoje, outra amanhã, tudo vai normal. Mas agora, estando fora, tudo fica meio cansativo. Por sorte, os amigos estão dando força, todo mundo ajudando. Tá tudo bem.

Aliás, a fidelidade em Ademir da Guia é coisa notável. Em vinte anos como profissional, teve apenas dois times. O Bangu e o Palmeiras. Em São Paulo, chegou em 61 e daqui nunca mais saiu, espécie de patrimônio palmeirense e com lugar cativo no coração de outras torcidas também sensíveis. Por isso, por causa dessa natural fidelidade, a sua história não possui lances fora do habitual.

É assim: com quinze anos, entra para o Bangu, depois de correr campos aos subúrbios cariocas, em peladas que somente fizeram-no lapidar uma espécie de malemolência do toque de bola, da passagem e finalização das jogadas.

Depois, Palmeiras. De 61 a 63, ainda não é titular do meio de campo, mas se aperfeiçoa calmamente, numa lenta preparação. Titular em 63 – e dessa condição só sairia por vontade própria, forçado pela sinusite, em setembro de 77.

Linha de equilíbrio, trajetória de bala de longo alcance ou, como diz João Cabral de Melo Neto, “Ademir impôs com seu jogo o ritmo de chumbo (e o peso), da lesma, da câmara lenta, do homem dentro do pesadelo”. Nada mais certo.

Ademir da GuiaDa Guia diz estar contente com o jogo de despedida oficial. Fica chateado apenas como teve de abandonar o futebol, ele imaginando que os problemas surgidos no nariz fossem algo simples, de fácil solução. Não eram. Tanto que não tem certeza do que teve – ou ainda tem: a coisa não tá de todo resolvida.

Era setembro de 77 e o médio aconselhou uma operação. Aos 35 anos, em plena forma, da Guia calculou que voltaria no início de 78, para talvez encerrar a carreira aos quarenta anos – tudo indicava isso, da técnica aperfeiçoada ainda intacta ao preparo físico, à capacidade de correr um jogo inteiro.

Pois em setembro de 77 fez a sua primeira operação no nariz. Nada de melhorar. Outra operação. Também nada de melhora. No início de 78, já pela terceira operação, voltou ao campo. Correu, correu – e sentiu-se mal. Tinha de fato de sair, largar o futebol até encontrar uma solução. E por quase quatro anos – de 77 a 81 – sua vida resumiu-se a uma correria entre hospitais, remédios, farmácias e novas consultas.

Foi apenas no meio do ano passado, ali por julho, que da Guia de novo pisou num campo para correr, buscar a forma perdida, experimentar com vontade o gosto da bola no pé. E foi somente há duas semanas que entrou num joguinho besta, em um campo da cidade, sentindo a emoção de vestir a camisa de um time (não um time grande, como o Palmeiras, Corinthians). Mas foi importante – principalmente para dar a certeza de que ele poderá jogar em simples peladas pelo interior. Assim, deve participar dos jogos do “Milionários”, ainda este ano.

(Tudo isso quem diz é da Guia. Com voz pausada e numa malemolência de garoto. Garoto esperto. Em instante algum se diz ressentido ou chateado pelas situações. Ao contrário. Sempre acha explicações que melhore a coisa parecida piorada). Assim:

– É. Parar aos 35 anos não estava nos meus planos. Eu pensava que iria até os 40. Porque eu tava bem, me sentia legal. E, quando o médico me disse para fazer uma operação, não pensei em nada de muito ruim. Depois, a coisa não melhorando, eu sendo operado, deixei de pensar no futebol, porque o importante era a minha saúde. Tava certo, não? E então nem me preocupei em largar o futebol – porque não tinha largado. Sempre tava pensando em voltar, era minha vontade. A coisa ficando ruim. Fiquei meio assustado. O que eu tive? Foi nariz, sinusite, eu não sei ao certo o que eu tive.

Ademir da GuiaE então surge o admirável da Guia, com sua saída:

– Podia ser pior. Já pensei se eu tivesse isso aos 30 anos? Iria ser ruim. Graças a Deus, a coisa só foi acontecer aos 35 anos. Um tempo melhor, não tão no auge de uma carreira, né?

Dinheiro Ademir da Guia ganhou. Não ganhou muito, ele confessa. Porque para ganhar bastante, raciocina, só em dólar, jogando fora do Brasil. Funcionário do Palmeiras, nos dois últimos anos treinou os times amador e infantil do clube. Como bico, trabalhava como vendedor para a fábrica de um amigo, localizada em Araraquara. Vendas? Como vendas? Diz, em ritmo de chorinho:

– É, eu gosto de vendas. Não é uma coisa presa, ali, você podendo viajar bastante. É gostoso porque você conversa com muitas pessoas. Não dá é pra ficar preso.

De novo, liberdade e prazer. Do futebol, da Guia guarda muitas boas lembranças. Como a entrada em um estádio lotado, as finais, as viagens. Alguma irritação? Ah, da Guia, o homem do equilíbrio, provocador do desequilíbrio alheio, é fatal.

– O treino, aquela rotina dos treinamentos, tudo aquilo era muito cansativo. A preparação cansava, cansava bastante. Isso cansava. Na segunda-feira, tudo começava de novo. Você lá batendo ponto. Se chegasse atrasado, sendo multado. Isto não é diversão. Diversão é o jogo em si, a partida do domingo. Agora, o treino, levantar cedo (da Guia tem cara de quem gosta de dormir), isso com tempo vai dando um cansaço enorme.

A arte, no caso o futebol, sob o regime da indústria. A criatividade, no caso os dribles, passes e gols, sob a face crua e ruim do cotidiano. E é difícil entrar e sair bem cedo dos campeonatos jogados entre cidades distantes, ligadas por ônibus, concentrações, aviões.

Ademir da Guia– Não, nunca entrei em campo cansado, sem vontade. Porque jogar é a compensação. Pra aquilo tudo que a gente se prepara. O mais fácil de tudo é o jogo. Saudades? Tenho saudades apenas dos jogos, não dos treinos. Mas quando parei, eu estava cansado. Os campeonatos começavam ali por janeiro, fevereiro. Perto de setembro, outubro, não aguentava muito mais, não. Ficava pensando em férias. Descansar – descansar daqueles treinos, muita concentração. Não dos jogos, disso nunca fiquei cansado, porque disso sempre gostei, ainda gosto – vai dizendo da Guia, sempre em voz calma.

A fase boa é a fase de total inspiração. Mas a fase ruim, aquela de toques errados, um estranho cansaço – essa fase é demais de ruim até com os supercraques, qualidade em que Ademir da Guia está colocado com bons pontos. E, por isso, por ser o totem no meio do campo, uma má fase acaba ampliada por várias lentes. Daí, a coisa dói. Dói na vaidade e na falta de resposta. Diz o sempre calmo da Guia:

– A coisa é curiosa. Tem fases que tudo vai bem. Outras, não. (N.R.: filosofia popular). Então sai técnico, muda jogador. Não tem explicação. No fundo, é onze contra onze. As vezes, um jogador te marca melhor. Ou é um goleiro que pega tudo – mas tudo mesmo. Ou então você fica pensando: será que o juiz marcou algo errado (N.R.: percebam a natural inocência do meio-campista). Existem mil coisas em uma derrota – ou que possam dar numa derrota.

E quando você esteve em uma má fase, qual o sentimento disso? O calmo da Guia ajeita a pergunta e chuta:

– Você fica mais preocupado, quando sai porque está mal, como sujeito que entra no seu lugar – fica de olho se ele está bem. Você está mal: joga uma partida, ok. É normal. Joga a segunda ruim, ok, não é incomum isso. Mas, a partir da terceira, a torcida já fala, a imprensa quer saber: Ademir, o que há que você tá jogando mal? Eu não sei, respondo. E não dá pra saber. Se você diz que está cansado, vão na pele do preparador físico. É assim. Agora, você tem de ter calma.

Calma. Tudo bem. As duas palavras de maior frequência no vocabulário de da Guia. E calma ele continua quando perguntado se não foi injustiçado ao não ir para a seleção – ir como devia, não aquela idazinha em 74, um único jogo, como se fosse uma bondade do inábil Zagalo. Então, da Guia, como convém ao seu estilo (de jogo e de fala), diz:

– Não fui injustiçado, não. É que na minha época existiam quatro bons jogadores (na verdade, três): Gérson, Dirceu Lopes e Rivelino. Eu e Dirceu Lopes não tivemos muitas chances. O Gérson jogava bem. O Riva foi lá e também jogou bem. No Brasil, por essa época, tínhamos 3, 4 jogadores bons para cada posição.

Ademir da GuiaMas, o da Guia, não dava raiva sair a convocação e você não ter o seu nome lá, anotado?

– É. Fazia falta. Mas não me magoava. Quando eu fui em 74, foi ótimo. Se nunca tivesse ido, teria ficado chateado. Era a única coisa que faltava na minha carreira. Claro, queria era participar de uma Copa do Mundo. E participei. Não ficava chateado. Esperava. Não saía, tudo bem. Seleção é uma coisa complicada. Também a coisa é difícil: não iria conversar com o Rivelino, que é meu amigo, e, quando ele entrasse em campo, torcer para ele sair e eu entrar – não dava, né? Não era uma coisa legal.

Cutucando a onça com vara curta, ele acaba soltando algo não muito frio, destituído de emoção. Ele recorda:

– Quando o Zagalo disse que eu iria entrar, naquele jogo contra a Polônia, eu fiquei contente. Porque tava lá e pensava: será que não vou jogar uma única vez? Vim aqui e não vou entrar? Bem, mas ganhar ou perder – a coisa é outra nesse caso.

O bom Ademir da Guia passou por vários desafios. Quase todos, venceu. Ao chegar em São Paulo, no distante ano de 61, muitos disseram que aquele seu estilo de jogar não daria certo. Mas, era, por que? Pelo simples fato de que o futebol paulista sempre foi corrido e da Guia seguida calmo, mas com régua e compasso. De novo, o poeta. Da Guia nega a apologia dos camaleônicos pela simples matemática dos artistas que adaptam o tempo à sua maneira – e não vice-versa.

Da Guia, você é calmo ou é também muito triste? Ele não sorri. Entende que não é ironia a pergunta, mas algo sério.

Ademir da Guia e Sócrates– Sou calmo… Desde pequeno… Acho que não vou mudar.

Mas da Guia se abre, de novo, e conta:

– Em 74, quando o Palmeiras foi campeão, estavam todos já pulando de alegria. Eu passei, andando, calmo. Todos: essa não, isso é demais. É que eu tava cansado mesmo, de tanto correr no jogo.

Ele conta o caso e se cala, mas de novo se revela:

– Às vezes sou contente ou um pouco triste. Sou assim.

No dia 22 de janeiro, um domingo, a Folha estampou, com chamada de capa, a despedida do Divino. Já na segunda, dia 23, a cobertura da vitória dos Amigos de Ademir por 2 a 1 sobre o Palmeiras. O ex-jogador ficou em campo por 36 minutos e desfilou sua tradicional elegância em campo.

Ademir da Guia jogou 36 minutos, pegou 18 vezes na bola, chutou duas vezes a gol e deu alguns passos errados. Estava cansado e feliz, quando desceu o vestiário para tirar as chuteiras que ele só pretende voltar a calçar para defender o time de veteranos do Palmeiras, clube no qual jogou de 1961 a novembro de 1977.

Ontem cedo, no Canindé, no intervalo da partida entre o Palmeiras e a Seleção dos Amigos do Ademir, o Divino ganhou de tudo: troféus, medalhas, uma salva de prata das mãos do presidente Paschoal Giuliano – que discursou agradecendo a tudo o que ele fez pelo clube – um diploma da Confederação Brasileira de Futebol, outorgando-lhe o Belfort Duarte, Cr$ 500 mil do Sindicato dos Atletas Profissionais, dez milhões de seu amigo-ausente Pelé, Cr$ 12.430.500,00 do pouco mais de 11 mil torcedores que foram à sua festa de despedida.

Enfim, essa foi a despedida oficial de Ademir da Guia, que muito fez pelo Palmeiras.

Como fiz na matéria sobre Marcos, também agradeço a esse craque por todas as alegrias. No meu caso, e de muitos outros, as alegrias que proporcionou ao meu saudoso pai e milhões de palmeirenses que o viram jogar. Obrigado, Ademir da Guia.


Thell de Castro é palmeirense, jornalista e editor do site TV História

MEMÓRIA: A ‘quase’ venda de Marcos para o Arsenal em 2003

Por Thell de Castro

Palmeiras2003A situação do Palmeiras era crítica em 2003. O time disputaria a segunda divisão do Campeonato Brasileiro, tínhamos poucas estrelas no elenco, levamos uma surra do Vitória em casa na Copa do Brasil, entre outros vexames.

Para desespero da torcida palmeirense, no dia 22 de janeiro de 2003, a Folha trouxe na capa do caderno de esportes, em letras garrafais: “Por US$ 4 mi, Palmeiras cede Marcos ao Arsenal”, anunciando a venda do santo ao time inglês. Trechos da matéria:

“O goleiro Marcos embarcou ontem para Londres para acertar sua transferência por 2,5 milhões de libras (US$ 4 milhões) para o Arsenal, time que conta com outro pentacampeão, Gilberto Silva.

 Desde o meio de 2001, Marcos assumiu o gol da seleção sonhando com a ida para o futebol europeu. A negociação, porém, só veio agora, após a desastrosa campanha do Palmeiras no Brasileiro 2002 – acabou rebaixado.

 Essa informação não escapou à imprensa britânica. “Depois da impressionante atuação na Copa do Mundo, Marcos sofreu um retrocesso com o descenso do seu time, o Palmeiras”, descreveu o serviço on-line da rede BBC.

 Oficialmente, o Arsenal não comenta o caso. Por seu lado, o Palmeiras divulgou um comunicado dizendo que o jogador foi liberado para viajar e negociar com “um clube inglês” e “com a condição de retorno para São Paulo até no máximo sexta-feira”.

 Marcos vai ficar dois dias em Londres conversando com os dirigentes do Arsenal para acertar um contrato de quatro anos. Ele quer se apresentar de vez no segundo semestre. Porém o clube, que tem dois goleiros reservas contundidos, quer o jogador lá.

 “Preciso de um tempo para arrumar minhas coisas e me acertar com meus pais e meu filho”, argumenta. Sua mãe, Dona Antônia, já aceita trocar a pacata Oriente (cidade natal de Marcos, a 465 km a noroeste de São Paulo) por Londres. “Vou e depois convenço meu marido a ir também, afinal, Londres não é o fim do mundo”.

 O goleiro de 29 anos quer se despedir do time jogando o Paulista, a Copa do Brasil e o Brasileiro. Depois terá a missão de substituir David Seaman, titular do gol do Arsenal e da seleção inglesa. Mesmo com a pretensão do goleiro de 39 anos de jogar mais uma temporada, todos dão como certa sua aposentadoria no meio do ano.

 Revelado no Palmeiras, Marcos começou como reserva de Velloso e se firmou no time titular no fim de 1998. Seu maior feito foi a conquista da Taça Libertadores 99, defendendo pênaltis, o que lhe valeu o apelido de “São Marcos”.

O jogador tinha contrato até julho de 2004 com o Palmeiras, mas sua transferência deve lhe render US$ 400 mil (10% da transação).

 O temor palmeirense é que Marcos repita agora o que fez no fim de 2002, quando chegou a pedir para não jogar e depois se contundiu – atualmente, está lesionado. A venda de Marcos foi anunciada um dia após a saída oficial do lateral Arce”.

MarcosNa mesma página da matéria, uma curiosidade daquelas que o Palmeiras era campeão em gerar naqueles tempos: o time anunciou a contratação do atacante Carlos Castro, 32 anos, que jogava no Necaxa, do México. “O clube informou que o colombiano foi indicado pelo técnico Jair Picerni”, dizia o texto.

Na Folha do dia seguinte, ao contrário da manchete arrebatadora em letras garrafais, uma pequena nota dizia que existia um impasse na contratação do goleiro.

“Marcos não deve cumprir a promessa de se reapresentar na sexta-feira ao Palmeiras. Segundo seu empresário, Claudio Guadagno, ainda há um impasse para a assinatura. O goleiro visitou instalações do clube e conversou com dirigentes. A imprensa inglesa saudou sua ida. “Seaman treme com Marcos voando para Londres” foi a manchete do diário londrino Guardian.

 No dia 24 de janeiro, nova reportagem do jornal, na capa do caderno de esportes, mas sem o mesmo destaque da manchete principal de dois dias atrás. “Marcos é esperado no Palmeiras, mas não pelo técnico do Arsenal”.

 O goleiro Marcos, titular da seleção na Copa, é esperado hoje no Palmeiras, e não no Arsenal. A negociação do jogador com o clube inglês não foi definida. O técnico do Arsenal, Arséne Wenger, disse em entrevista ao site oficial do time que Marcos é só uma opção e que nada está acertado. (…)

 Quando saiu do Brasil, o ídolo palmeirense planejava defender o time do Parque Antarctica até o meio do ano, juntando-se ao Arsenal apenas em junho. O valor da transação entre os clubes seria, na verdade, um pouco inferior a US$ 4 milhões (US$ 3,8 milhões), mas esse não seria o problema. A questão é que o Arsenal não está certo da aquisição do goleiro do penta – quer um jogador que possa atuar desde já e por muito tempo no clube. (…)

 Marcos, que não joga há quase três meses, já admite se apresentar agora ao clube londrino. (…) Quando Marcos embarcou, a negociação parecia certa. O empresário Cláudio Guadagno, o ex-diretor palmeirense Marcos Bagatella e o executivo Dick Law viajaram com ele para a Inglaterra”.

Folha - Marcos
Reprodução – Folha de S.Paulo

No sábado, dia 25, véspera da estreia do time no Paulistão contra o Mogi Mirim, a Folha destacou na terceira página do caderno de esportes: “Marcos fica no Brasil até o meio do ano”.

“Saí daqui jogador do Palmeiras e voltei jogador do Palmeiras”. Marcos está de volta mesmo ao time do Parque Antarctica. O goleiro se apresentou ontem ao clube após a sua viagem de negócios à Inglaterra, onde planejava acertar contrato com o Arsenal, treinou com os seus companheiros em uma tarde chuvosa e disse em uma coletiva que fica pelo menos até o meio do ano no Palmeiras.

 “Acho que todo jogador de linha pensa em se destacar e ir para a Europa. Goleiro quase não tem mercado lá. Então nem pensava em me transferir. Fui pego de surpresa com tudo isso. Tenho muita coisa para resolver aqui e não teria como ir agora”, disse, Marcos, sobre a negociação frustrada.

Estadão - Marcos
Reprodução – O Estado de S.Paulo

Após essa reportagem, o burburinho diminuiu e foi sumindo da mídia. No dia 1º de fevereiro, uma pequena nota no jornal disse que Marcos ainda estaria negociando com o time inglês, que havia contratado o goleiro francês Warmuz.

Para sorte do torcedor palmeirense, Marcos ficou. Foi um dos líderes do time na Série B, ganhou o Paulista de 2008 e passou por tudo que aconteceu nesses anos sem arranhar sua imagem de ídolo.

Teve problemas, lesões, ficou fora de muitos jogos, vimos ainda Sérgio, Diego Cavalieri, Bruno e Deola jogarem em seu lugar, mas continuou no elenco, se salvando em meio a vários jogadores que, nitidamente, não tinham comprometimento com o clube, até se despedir dos gramados, em dezembro de 2012.

Enfim, enorme azar do Arsenal e grande sorte nossa que você ficou. Obrigado, São Marcos, por tudo o que fez por nós.

Marcos


Thell de Castro é palmeirense, jornalista e editor do site TV História

MEMÓRIA: Evair, de ‘elefante branco’ a ídolo da torcida

Por Thell de Castro

Careca e EvairNa coluna de estreia, falei sobre as ‘forças negativas’ que acompanhavam o time do Palmeiras em 1992, antes da chegada da Parmalat. Voltamos um pouco mais no tempo e, ainda naquela seca de títulos e ídolos, lembramos que a situação não era fácil.

No dia 10 de junho de 1991, a Folha de S. Paulo noticiou a chegada de um jogador conhecido por ser artilheiro por onde passou. “Palmeiras acerta a troca de Careca por Evair”. Trechos da matéria:

“O Palmeiras acertou a troca do atacante Careca [Bianchesi] por Evair, que estava na Atalanta, de Bergamo, da Itália. O negócio foi fechado no sábado depois de uma reunião entre Franco Previtalli, dirigente do clube italiano, e o jogador palmeirense. Os clubes já tinham feito o acordo.

A troca dependia do acerto dos jogadores com seus novos clubes. (…) O centroavante Evair, 25 (1,89 m e 80 kg), ficou três temporadas na Atalanta, onde formou ataque ao lado do argentino Cláudio Caniggia. Na temporada 1988/89, o ex-jogador do Guarani de Campinas jogou 25 partidas e marcou dez gols. (…) No último campeonato, o time não foi bem e a diretoria resolveu fazer mudanças. O desejo de Evair de voltar ao Brasil motivou a troca. Sua data de apresentação não está definida”.

No dia 12 de junho, a mesma Folha fez uma matéria sobre a apresentação de Evair e perguntou se a contratação era um bom negócio. Vamos aos trechos de “Evair se apresenta ao Palmeiras e fará exames durante cinco dias”:

Evair“O real estado clínico do centroavante Evair, que se apresentou ontem no Palmeiras, ainda é uma incógnita e sua contratação corre o risco de entrar para a galeria dos maus negócios do clube. O novo patrimônio do Palmeiras, avaliado em aproximadamente US$ 800 mil, veio do Atalanta”.

Em suma, a matéria dizia que Evair tinha problemas físicos, como uma hérnia de disco da época do Guarani que não se manifestou nas três temporadas em solo italiano. Um pouco antes, o time contratou Rubem, do Guarani, abriu mão dos exames médicos, o jogador tinha problemas no joelho, foi operado e acabou ficando meses fora dos gramados.

No dia 18 de junho, a Folha trouxe outra matéria, “Hérnia de disco de Evair aumenta os maus negócios do Palmeiras”. Tudo conspirava contra a contratação do jogador, que quase foi devolvido. Por curiosidade, vamos listar alguns trechos desta matéria de Mauro Teixeira, que cita péssimos negócios feitos pelo clube.

“A hérnia de disco detectada no atacante Evair vem coroar uma série de maus negócios feitos na gestão de Carlos Facchina Nunes na presidência do Palmeiras desde 89. (…) Evair custou US$ 1 milhão ao Palmeiras, que recebeu mais US$ 2 milhões pelo passe de Careca. Enquanto o ex-palmeirense serve à seleção brasileira que disputará a Copa América, o clube do Parque Antarctica terá de decidir o que fazer com o elefante branco que tem nas mãos.

A Folha apurou que o minucioso exame feito em Evair, que incluiu uma tomografia computadorizada, apontou a hérnia de disco. De salvador da pátria, Evair transformou-se num ‘jogador de risco’. O seu destino só será decidido na reunião marcada para o dia 24, quando ele volta de Crisólia (MG), onde acompanha o estado de saúde de seu pai.

A reunião contará com a presença do técnico Nelsinho e terá como pauta o relatório já entregue à diretoria pelo médico do clube, André Pedrinelli. Os dirigentes devem convocar ainda o procurador de Evair e poderão até tentar desfazer o negócio com o clube italiano. O parecer médico desaconselha a contratação do atacante e coloca a responsabilidade sobre os ombros dos dirigentes.

Caso o negócio seja desfeito, a frustração de torcedores e ‘corneteiros’ poderá colocar mais lenha na fogueira do agitado ambiente político do Palmeiras. Na tentativa de quebrar o jejum de 15 anos sem títulos, a diretoria do clube tem provocado frequentes crises com ‘negócios da China’”.

Veja você que “agitado ambiente político do Palmeiras” está (e estará) em todas as colunas que fizermos aqui no Verdazzo, seja em 1978, 1986, 1991, 1992, 2003, 2017, entre muitas outras matérias que estou pesquisando… Confira no quadro abaixo alguns dos negócios feitos por Facchina que foram enumerados pelo jornal.

Maus Negócios
Reprodução: Folha de S.Paulo

No dia 21 de junho, veio o “dia do fico” de Evair no clube. Confira trechos da matéria “Dirigentes do Palmeiras garantem a permanência de Evair no clube”:

Nelsinho Baptista e Evair“A cúpula do Palmeiras dedicou a tarde de ontem para os desmentidos. Ela formalizou que o futuro do centroavante Evair não está ameaçado no clube, que aproveitará o jogador no Campeonato Paulista mesmo com a constatação da hérnia de disco através de uma tomografia computadorizada. O médico André Pedrinelli negou que o atacante corre o risco de uma cirurgia.

Ele garantiu que Evair está apto a jogador futebol sem a necessidade de um tratamento especial. Na verdade, não havia outra alternativa aos dirigentes senão assumir a permanência no Palmeiras. Se ele tivesse uma lesão mais grave que comprometesse sua atividade normal, dificilmente o clube conseguiria repassá-lo para outra equipe pela repercussão negativa do fato.

O triunvirato de diretores que acompanhou o ‘caso Evair’ – Adriano Beneduce, Jorge Adamo e Gilberto Cipullo – se debruça no argumento de que Evair jogou três temporadas no Atalanta, da Itália, sem nada sentir. (…) O trio desmentiu, ainda, que o zagueiro Luís Eduardo, contratado na segunda-feira, tenha um problema no púbis. ‘É mentira’, afirmou Adamo. Ele revelou que o departamento médico obteve informações do Grêmio, ex-clube de Luís Eduardo, dando conta que ele jamais teve essa lesão”.

No dia 25 de junho, Evair se apresentou novamente, treinou durante 40 minutos, não sentiu nada e prometeu que ficaria em forma física para a disputa do Campeonato Paulista, em julho.

Evair estreou no Palmeiras no dia 7 de julho de 1991, em amistoso contra o Mogi Mirim, quando o Verdão foi goleado por 4 a 2. “Foi a primeira derrota do técnico Nelsinho desde que assumiu a direção do time palmeirense. Demétrio (2), Givanildo e Afrânio marcaram para o Mogi, enquanto o estreante Evair e Betinho anotaram para o Palmeiras, ambos em cobrança de pênalti”, informou pequena nota da Folha de 8 de julho.

No dia 10 de julho, o Palmeiras acertou a contratação de César Sampaio junto ao Santos. Desta forma, vemos que alguns dos ídolos do esquadrão de 1993/1994 já chegaram ao clube em 1991.

O tempo passa…

EvairPara finalizar, abaixo trechos de reportagem de 10 de novembro de 1991, “Palmeiras desafia primeiros sinais de crise”:

“O clássico de hoje é decisivo para o Palmeiras, apesar de o técnico Nelsinho afirmar o contrário. O time já começa a dar sinais de instabilidade emocional, ocasionada pela necessidade imediata de conquistar um título. A perda da liderança do grupo Verde para o Corinthians, na fase de classificação, e a precipitação do departamento médico em liberar alguns jogadores abriram feridas que não suportam uma derrota.

O problema mais grave está no ataque, o ponto fraco da equipe. Sem Evair, em recuperação de uma contusão no pé esquerdo há 50 dias, o Palmeiras não encontrou um substituto. Os médicos alteraram os métodos de tratamento, passam a adotar infiltrações de analgésicos e acreditavam que ele poderia jogar hoje. Evair chegou a pedir ao técnico para ficar pelo menos no banco de reservas. ‘É um absurdo. Você não está curado’, foi a resposta de Nelsinho”.

Posteriormente, em 1992, durante outra crise na equipe, como já falei no primeiro texto aqui no Verdazzo, Evair foi afastado da equipe por Nelsinho, por ‘deficiência técnica’ e por problemas disciplinares, como em entreveros com o companheiro de equipe Betinho. Cogitou-se até a negociação do jogador. Com a chegada de Otacílio Gonçalves, ele foi reintegrado e, com a ajuda da equipe milionária montada pela Parmalat, fez gols decisivos, foi um dos líderes da equipe e nos deu muitas alegrias, se transformando em um grande ídolo.

Enfim, Evair Aparecido Paulino ficou no Palmeiras entre 1991 e 1994, depois voltando para a vitoriosa campanha na Libertadores de 1999. Fez 245 jogos com a camisa alviverde e marcou 126 gols, uma média superior a 0,5 por jogo.

Evair
Daniel Guimarães/Folhapress

O que seria um “elefante branco”’, como disse a Folha, se transformou em um excelente negócio. Como sabemos, Careca Bianchesi sumiu e, provavelmente, não nos daria tantas alegrias quanto Evair. Isso mostra que, muitas vezes, é preciso arriscar – mesmo que, neste caso, como as matérias mostraram – foi mais pelo medo do ‘mico’ do que uma aposta verdadeira.

Só nos resta agradecer a Evair por tudo que fez em sua passagem pelo Palmeiras, particularmente a atuação de gala, por exemplo, na final do Paulistão de 1993, entre tantas outras.


Thell de Castro é palmeirense, jornalista e editor do site TV História

MEMÓRIA: A máquina do Palmeiras de 96 começou a ser montada em 95

Por Thell de Castro

Camisa 1996Apesar de ter conquistado apenas um Campeonato Paulista, o time de 1996 do Palmeiras marcou época. A montagem dessa equipe começou bem antes, em outubro de 1995. É claro que existia o fator Parmalat, mas vamos relembrar essa história e ver como o clube se mexeu para superar um ano difícil.

Vale lembrar que, após dominar os campeonatos de 1993 e 1994, o Palmeiras teve um ano, digamos, ruim em 1995. O time teve a saída de peças importantes e, apesar de contratar vários nomes de peso, não deu tão certo, culminando com a perda do Paulistão, da Libertadores e do Brasileiro.

Mas o torcedor palmeirense, naquela ocasião, ficou apenas um ano sem comemorar uma taça. No dia 17 de novembro de 1995, em crise no Campeonato Brasileiro, o Palmeiras surpreendeu e anunciou dois reforços para a temporada de 1996, conforme a reportagem “Palmeiras abre mão do Brasileirão”, da Folha de S. Paulo:

A diretoria do Palmeiras/Parmalat não acredita nas chances de classificação do time para as semifinais do Campeonato Brasileiro deste ano. ‘Como estão surgindo oportunidades para fechar negócios, antecipamos a renovação’, disse Seraphim Del Grande, vice-presidente de futebol do Palmeiras. ‘No Brasileiro, não dependemos mais de nós. Temos que torcer contra SCCP e Botafogo’, lamentou.

Vincenzo Roma, gerente de esportes da Parmalat, admite que já não pensa no Brasileiro de 95. ‘A Parmalat tem contrato com o Palmeiras até 98’, declarou. Segundo Roma, a meta do Palmeiras é vencer o Brasileiro de 96, garantindo vaga para a Libertadores de 97. (…) Alberto Strufaldi, dirigente do Palmeiras, confirmou à Folha a vinda do treinador Vanderlei Luxemburgo teve como objetivo a obtenção de resultados em 96. ‘Ele pegou o time em situação difícil no campeonato’, afirmou. ‘Trouxe uma grande lista de possíveis contratações. Em 96, vamos ter o mesmo sucesso de 93 e 94’.

O único preocupado com a renovação do atual elenco com as contratações de Djalminha e Luizão, do Guarani, e Junior, do Vitória (BA), é José Carlos Brunoro, diretor de esportes da Parmalat. ‘Atrapalha quando começam a falar em desmanche. Não temos a intenção de vender ninguém’, afirmou à Folha, em entrevista por telefone. Logo depois, no entanto, Brunoro confirmou que Amaral, por exemplo, não deve continuar em 96. “O passe dele é só Palmeiras, que precisa de dinheiro”.

Folha de S.Paulo
Reprodução

Outra matéria, na mesma página, falava sobre a contratação de Júnior e de outras movimentações no elenco.

“Depois da apresentação de Djalminha e Luizão, ontem, no Parque Antarctica, o Palmeiras anunciou a vinda do lateral-esquerdo Júnior, 22, para a temporada 96. O jogador, que vai continuar defendendo o Vitória (BA) até o final do Brasileiro, custou US$ 600 mil, além do passe do meia Beto, avaliado em US$ 100 mil. O meia Aílton, que está no Fluminense, confirmou ontem que também foi procurado pela diretoria do clube paulista.

A diretoria do Palmeiras/Parmalat pretende reformular o elenco para a temporada 96. ‘Temos propostas pelo Rivaldo, Antônio Carlos, Amaral e Edílson’, disse o dirigente Alberto Strufaldi. ‘O que ganharemos com a venda de jogadores, reaplicaremos no futebol, como fazemos desde o início da parceria com a Parmalat’.

O diretor de esportes da multinacional, José Carlos Brunoro, confirmou o que disse Strufaldi. “Se ficamos sem César Sampaio, Zinho e Evair em 95, trouxemos Mancuso, Muller, Nílson e Cafu”, afirmou Brunoro.

Desde 92, quando começou a parceria com a Parmalat, foram gastos cerca de US$ 26,6 milhões na aquisição de jogadores, sem contar com o passe de Cafu. As vendas somam cerca de US$ 26,1 milhões”.

Como previsto, o time foi eliminado do Brasileirão e continuou a reformulação, sem estardalhaço. Além disso, naquela época, não existiam os que se matam no Twitter para dar informações em “primeira mão”, muitas vezes acreditando em qualquer um que lhes fale sobre possíveis contratações, ou, até, inventando reforços somente para aparecer.

O ano virou e as contratações continuaram

RivaldoPulamos para 8 de janeiro de 1996, quando o time foi fazer a pré-temporada em Serra Negra, pensando no Campeonato Paulista.

A matéria “Japão deve fazer proposta por Rivaldo” falava sobre a possível venda do meia para um time do Japão. Ele não saiu, como sabemos, e foi vendido no meio do ano para o La Coruña, da Espanha. Voltando a falar sobre a reformulação:

“As novidades são os jogadores Marquinhos, Claudio, Gustavo, recém-contratados junto ao Flamengo, e o zagueiro Sandro, que veio do Juventude (RS). O meia Djalminha, o atacante Luisão e o lateral Júnior, contratados ao final do Campeonato Brasileiro, também viajam com o time.

A diretoria do clube ainda tenta acertar a renovação dos contratos do volante Flávio Conceição e do meia-lateral Cafu. Ele ameaça não viajar para Serra Negra, caso não haja acordo com o clube. A diretoria, no entanto, exige que ele viaje, já que seu contrato termina no final do mês.

O Palmeiras apresentará seu novo time aos torcedores em um amistoso marcado para o próximo dia 19, contra o Grêmio, no Parque Antarctica. Depois, a equipe participará de um torneio internacional, com Flamengo e Borussia Dortmund, da Alemanha, no Nordeste”.

Bom, a partir daí, já sabemos o restante da história. O time foi montado, veio o excelente cartão de visita que foi a goleada frente ao Borussia, que não viu a cor da bola, e a sequência de belas vitórias no Paulistão, que garantiram o campeonato com antecedência, e também na Copa do Brasil, quando o time foi parado pelo Cruzeiro na final, perdendo de forma inacreditável no Palestra.

Que 2017 tenha sido uma espécie de 1995, garantindo glórias para as próximas temporadas.


Thell de Castro é palmeirense, jornalista e editor do site TV História

MEMÓRIA: Os bastidores da assinatura do acordo entre Palmeiras e Parmalat, em 1992

A partir de hoje, o Verdazzo publicará todos os sábados uma coluna assinada pelo jornalista Thell de Castro, com episódios da História do Palmeiras sob a perspectiva da época, com excertos da mídia no momento em que a notícia acontecia. 

A série começa com a divulgação do acordo de cogestão entre Palmeiras e Parmalat,e m 1992. 


Crise, pressões e especulações: os bastidores da assinatura do acordo entre Palmeiras e Parmalat, em 1992

Palmeiras assina acordo de cogestão com a multinacional italiana e se prepara para viver nova fase; enquanto isso, time sofre com jejum, brigas internas e jogadores citam forças negativas que atrapalham a equipe

Primeira foto do time do Palmeiras após o acordo com a Parmalat, ainda sem reforçosTodo mundo sabe como foi vitoriosa a parceria entre Palmeiras e Parmalat nos anos 1990. Após um longo período sem títulos, ganhamos o Campeonato Paulista de 1993, quando a competição ainda era muito valorizada, em cima do maior rival, com um show de bola. Tem coisa melhor? Depois veio um título atrás do outro.

Mas vamos relembrar o início dessa história, como se anunciou esse acordo, através de pesquisa no acervo da Folha de S. Paulo.

A primeira notícia sobre o assunto é de 14 de fevereiro de 1992. E já começou com especulação. “Palmeiras quer contratar Dener da Portuguesa”. Dizia o pequeno texto: “O Palmeiras sonha em contratar Dener da Portuguesa. O dinheiro viria de um convênio com a multinacional Parmalat, que pode ser fechado hoje à tarde na Itália. Se não for possível a vinda do jogador para o Campeonato Brasileiro, os dirigentes esperam até o meio do ano”.

Se fosse hoje, os torcedores estariam alvoroçados no Twitter e nos grupos de WhatsApp e o Conrado colocaria aquele famoso fluxograma para pegar os mais desesperados. Como se sabe, Dener não veio, mas o convênio sim.

No dia 18 de fevereiro, outra notícia pequena, no meio de uma matéria sobre uma vitória do Santos sobre o Guarani por 1 a 0 pelo Campeonato Brasileiro de 1992, falava que o acordo deveria ser fechado naquele dia.

O Palmeiras deve fechar hoje um acordo de US$ 500 mil por ano com a multinacional italiana Parmalat. A empresa pagará a rescisão de contrato de patrocínio com a Coca-Cola, que é de US$ 700 mil. A Coca-Cola dá US$ 200 mil por ano clube. A Parmalat vai investir cerca de US$ 40 mil por mês. A curto prazo, o uniforme do Palmeiras será mudado e o nome da Parmalat será escrito na camisa. Nenhum novo jogador deverá vestir a camisa do Palmeiras nos próximos meses”, dizia o texto.

Nelsinho Baptista e SergioO pouco destaque dado ao possível acordo talvez se explique pela escassez de títulos e notícias boas que o Palmeiras enfrentava naquela época. Outra notícia, no dia seguinte, jogava um balde de água fria no palmeirense, pelo menos por algum tempo. No mesmo dia, o Palmeiras jogaria contra o Bragantino e o técnico Nelsinho Baptista tentava administrar uma crise interna entre Evair e Betinho.

Junto com a ficha do jogo, a Folha publica: “O presidente Carlos Facchina Nunes informou ontem à tarde que o acordo com a Parmalat não será assinado tão já. ‘Hoje eu terei um encontro com diretores da Parmalat, mas posso te garantir que em menos de um mês nada acontecerá’ ”, afirmou.

A chegada de Brunoro

De 18 de fevereiro pulamos para 1º de abril, quando a Folha voltou ao assunto: “Brunoro pode dirigir esportes no Palmeiras”, dizia a manchete.

Leia trechos do texto: “Para derrubar a carga de 16 anos sem títulos, o Palmeiras deve contar com o trabalho de José Carlos Brunoro, ex-gerente de esportes do Pirelli de Santo André, que pode assumir o cargo de diretor de esportes do clube. Brunoro disse ter sido convidado pela diretoria da Parmalat, empresa multinacional italiana que está em negociações de patrocínio com o Palmeiras. (…) Pelo projeto, inédito no futebol brasileiro, Brunoro seria uma espécie de manager e ficaria responsável pelo futebol profissional, futebol do salão, vôlei e basquete”.

No dia 7 de abril, os conselheiros palmeirenses se reuniram para analisar o acordo com a Parmalat. Discussões, debates, acordo aprovado, seria assinado dentro de pouco tempo.

Amistoso com o Parma celebra acordo

No dia 28 de maio de 1992, as notícias já eram melhores e a nossa epopéia estava prestes a começar. O Palmeiras enfrentaria às 20h, no Palestra Itália, o Parma, “num amistoso que celebrou o acordo de cogestão técnico-administrativa entre o clube a empresa italiana Parmalat”, como citou a Folha. “O acordo marca a profissionalização dos cartolas nos clubes brasileiros. José Carlos Brunoro, diretor de esportes da Parmalat, cuida dos resultados (e do dinheiro) da cogestão – a companhia investe só neste ano US$ 500 mil no clube”, completava o texto.

O Palmeiras venceu por 2 a 0, gols de Betinho, aos sete minutos do primeiro tempo, e Toninho Cecílio aos 46 do primeiro. Mais de 12 mil pessoas compareceram ao estádio.

O Verdão jogou com Carlos, Odair, Toninho, Tonhão e Biro; César Sampaio, Edu Marangon, Luís Henrique e Betinho; Daniel e Paulo Sérgio, técnico Nelsinho. O Parma veio com Taffarel, Donatio, Benarrivo, Minotti e Apolloni; Nava, Zoratto, Osio, Buga; Asprilla e Agostini, técnico Nevio Scala.

As tais forças negativas…

Evair na final do Campeonato Paulista de 1992Como ainda eram tempos de vacas magras – o final desse tempo, pelo menos até 2000 – “a festa no Parque Antarctica vai servir também para amenizar o trauma pela desclassificação no Campeonato Brasileiro. Eliminado na fase classificatória, o clube faz planos para o Paulista do segundo semestre, prometendo, com a ajuda da Parmalat, fazer grandes contratações”, dizia a Folha.

Outra parte interessante do texto dizia que Evair, Andrei e Jorginho continuariam afastados por indisciplina e poderiam ser negociados. Vou explicar com detalhes em outro texto posterior, mas Evair foi mantido no elenco com a saída de Nelsinho e se transformou em um dos grandes ídolos da torcida palmeirense.

O ano de 1992, apesar de marcar o início da parceria, não foi um mar de rosas. O Palmeiras começou mal o Paulistão, Nelsinho foi demitido em 19 de agosto, após três derrotas e um empate em zero com o Noroeste, e chamou os torcedores que fizeram pressão de covardes. Dois técnicos recusaram o clube, Candinho e Valdir Espinosa. Raul Pratalli, comandante dos juniores, assumiu o time interinamente e sonhava com uma chance, que não veio.

O time foi para Parma, na Itália, com exceção de dois diretores que integrariam a delegação. “A demissão acabou atrapalhando os planos de Adriano Beneducci e Gilberto Cipullo, que não poderão passar um final de semana na Itália. O presidente Carlos Facchina retirou seus nomes da delegação para que fiquem no Brasil procurando um novo técnico”.

O Palmeiras acertou com Otacílio Gonçalves, do Paraná Clube, que já chegou com grande pressão: “Hoje ele se apresenta ao clube que o contratou por um ano. Chega ao mesmo tempo em que os jogadores desembarcam de sua frustrada excursão italiana, pródiga em almoços e jantares espetaculares, mas pobre no resultado: 2 a 0 para o Parma, gols de De Chiaro e Pizzi, em partida que celebrou o acordo Palmeiras/Parmalat. “O Palmeiras é um clube difícil”, disse, em Parma, o próprio presidente Carlos Facchina. Gonçalves foi avisado da ‘barra pesada’ palmeirense e, mesmo assim, aceitou a missão recusada por gente como Wanderlei Luxemburgo, Candinho e Valdir Espinosa”.

Outro trecho da matéria que mostra como era o clima no clube: “Segundo o meia Daniel, uma profusão de forças negativas ronda o Palmeiras e levam os jogadores a proporcionar exibições ruins como a de sábado. Em conversas com jogadores e dirigentes, percebe-se que as tais forças negativas são, na verdade, o trauma da demissão de Nelsinho e a pressão das torcidas organizadas. Pode-se somar a isso a ausência de pelo menos um craque e também o jejum de títulos. Mas o que é o ovo e o que é a galinha?”.

Isso mostra a importância do choque de gestão, profissionalismo, e, claro, investimentos. As tais forças negativas sumiram rapidamente a partir de 1993, voltando com a saída da Parmalat, em 2000, quando o clube voltou a andar com suas próprias pernas, por caminhos bastante tortuosos até pouco tempo atrás.


Thell de Castro é palmeirense, jornalista e editor do site TV História