Compras e vendas colocam Mattos em xeque: ponderações além do óbvio
Cesar Greco/Ag.Palmeiras
Os torcedores palmeirenses somos seres altamente bipolares,
desde os tempos da Taça Savoia. Nossas reações ao que acontece em tudo
relacionado ao Verdão, via de regra, são extremadas, seja para o bem, seja para
o mal.
Além dessa característica marcante, nossa torcida
desenvolveu nas últimas décadas outro comportamento interessante: é
extremamente desconfiada. Desde que os primeiros jornalistas “de bastidores”
surgiram, com as quentinhas das políticas dos clubes, os fatos passaram a
ganhar razões ocultas. Os torcedores encarnam Sherlock Holmes e deduzem, cheios
de razão, o porquê de determinado fato ter acontecido – normalmente, começam
suas frases elucidativas com “a verdade é que…”
Ultimamente, diante do mau desempenho de Carlos Eduardo nestes
primeiros sete jogos da temporada, muito se tem questionado a lisura de Alexandre
Mattos nos negócios. A desconfiança aumentou com a notícia de que o diretor de
futebol estaria na Europa em vias de vender Vitão e Luan Cândido, a fim de
equilibrar o fluxo de caixa dos próximos meses.
A explicação dada à imprensa é de que existe a possibilidade
do Palmeiras ser condenado nos próximos meses a pagar cerca de R$ 40 milhões ao
empresário Antenor Angeloni pela compra de Wesley, na gestão Tirone. Há vários
aspectos nessa história que precisam ser desenrolados.
Mais uma vez, a
discussão sobre o uso da base
Fabio Menotti/Ag.Palmeiras
A decisão de usar um jogador da base ou vendê-lo já foi objeto de um post, por ocasião de uma suposta oferta para vender Papagaio, em dezembro. O que temos à vista são as atuações de Vitão e Luan Cândido nos times de base, seja do Palmeiras, seja da seleção da CBF.
Vitão parece exercer liderança sobre os companheiros, característica importante para um zagueiro. O garoto é capitão do Palmeiras e da seleção desde o sub-17 e nunca deixou de ser convocado desde sua primeira aparição com a amarela. Mas apesar de ter seus predicados, Vitão não mostrou, em campo, nada que saltasse aos olhos. Parece ser um bom zagueiro – mas iguais a ele, é possível ver vários por aí, pelo menos por enquanto.
Pedrão, que foi emprestado ao América, parece bem mais
pronto e segue o fluxo programado pela comissão técnica: um ano só treinando
com os profissionais, depois percorre um ciclo de empréstimos para pegar
cancha, para aí ser avaliado se pode integrar nosso elenco. Victor Luis cumpriu
esse roteiro. Vitinho e Papagaio estão passando por ele. Outros como Anderson e
Matheus Rocha foram emprestados direto, sem vivenciar o dia-a-dia da Academia
de Futebol.
Luan Cândido parece um caso de exceção. Seu talento e
maturidade dentro de campo chama muito a atenção. A chance de estarmos diante
de um jogador extra-classe para o futebol mundial parece real e negociá-lo
agora é uma tacada de alto risco, neste caso, não só para quem compra, mas
também para quem vende. Estas avaliações, claro, são superficiais, de quem vê
apenas as partidas e não acompanha os treinamentos e o comportamento
intra-muros dos meninos.
Fluxo de caixa
prejudicado
A notícia de que Mattos foi à Europa para vender os garotos
por conta de um possível solavanco no fluxo de caixa, ainda por conta do caso
Wesley, deixa várias pontas soltas.
O Palmeiras tem se caracterizado nos últimos anos pela
extrema organização nas finanças. Ocorre que ações jurídicas antigas, que datam
da gestão Tirone para trás, seguem correndo e a estratégia do Departamento
Jurídico tem sido buscar acordos para ações tidas como “perdidas”, a fim de
diminuir o valor total a ser pago. E isso muitas vezes envolve pagar à vista,
ou em poucas parcelas, para reduzir o valor total.
No caso de Antenor Angeloni, um acordo satisfatório havia
sido costurado na primeira gestão de Paulo Nobre, mas o COF, por obra de
Mustafá Contursi, vetou. Isso irritou demais o empresário catarinense, que hoje
se recusa a voltar a conversar como Palmeiras e a ação, que com os juros já beira
os R$ 40 milhões, está em vias de ser executada. O timing dessa e de outras
execuções é difícil de ser previsto e por vezes isso acaba exigindo alguns
sacrifícios no caixa. Tudo isso explicaria esta viagem de Mattos à Europa que
está irritando tanto a torcida.
O problema parece ainda maior porque Carlos Eduardo, a
segunda contratação mais cara da História do clube, um jogador que nunca chamou
a atenção de forma positiva em nenhum clube por que passou, faz um começo de
temporada melancólico.
A balança não pode
ser seletiva
O folclore do futebol é recheado de histórias sobre
negociações espúrias nas quais os cartolas dos clubes levam o famoso “por fora”.
Tão recheado que parece difícil não supor que isso realmente acontece por aí –
talvez não com a frequência com que a imaginação popular sugere, mas acontece.
Quando uma operação como a de Carlos Eduardo aponta para um saldo
negativo, como acontece neste momento, a desconfiança aumenta. Detetives de
rede social cravam que aí tem coisa.
O que poucos parecem ponderar é que a função de diretor de futebol é passível
de grandes erros, assim como pode render grandes tacadas. Ninguém sabe ao certo
como um jogador recém-contratado vai render. Ao avaliar um diretor de futebol, a
balança não pode ser seletiva, não se pode deixar nenhuma negociação de fora.
Para ser justo, é preciso tratar do saldo total.
Não é só a segunda maior contratação da História do Palmeiras
que está mal. A primeira também: Borja custou mais de R$ 30 milhões e está
enlouquecendo as trombetas do apocalipse da rua Palestra. Só com o 37 e com o 9,
são mais de R$ 50 milhões. Mas e quanto Mattos, com seu faro para negócios, já
conseguiu de lucro para o clube? E em meio a isso tudo, quão forte foram os
elencos que ele montou?
Quanto foi o saldo técnico e financeiro das contratações de Zé
Roberto, Tchê Tchê, Moisés, Vitor Hugo, Keno, entre outros casos notórios? Como
colocar de lado sua atuação junto a Manchester City e Barcelona para prolongar
as estadas de Gabriel Jesus e Mina no clube, mesmo muito bem vendidos? Como
esquecer o chapelaço nos inimigos para contratar Dudu, nosso maior ídolo da
atualidade?
Nestes pouco mais de quatro anos, entre compras e vendas, Mattos
deve ter fechado cerca de duas centenas de negócios; mesmo com contratações
como Ryder Mattos, Rodrigo, Kelvin, Victor Ramos e Emerson Santos, o saldo financeiro
certamente é positivo e tecnicamente o clube vem ganhando títulos.
O salário de nosso diretor é muito bom para que ele não caia
em tentação – se caiu ou não, em meio a todas essas negociações, é algo que vai
permanecer para sempre no folclore, da mesma forma que antigos diretores de
futebol do clube sempre lidaram com essa desconfiança – a não ser que algo
concreto venha à tona. O feeling do
presidente, que é quem sempre dá a palavra final em cada negociação, é a única
coisa que pode frear um negócio aparentemente “estranho”. E se o técnico bate
na mesa que quer o Carlos Eduardo, é mais difícil pisar nesse freio.
Para o torcedor que reclama mas paga pelo ingresso, paga Avanti e tudo o mais, no final das contas só interessa o momento, se o time está jogando “bem” ou não. Resultado em clássico conta muito. Pouco importa se é pré-temporada, se é paulista, se foram só sete de 80 jogos e existe um planejamento de evolução técnica. Se tem reforço caro jogando mal, ainda mais depois de perder um Derby, vai ter gente levantando lebres na Internet, cometendo, supostamente, injustiças. Ou não. Isto tudo, no fundo, é um saco, mas é elementar. Não é, Watson?
O Verdazzo é um projeto de independência da mídia tradicional patrocinado pela torcida do Palmeiras.