Por que a base do Palmeiras precisa fornecer mais jogadores para o time de cima
O Palmeiras é hoje o protagonista do futebol brasileiro e
sul-americano graças a um meticuloso processo de recuperação financeira
iniciado em 2013, que permitiu que o clube conseguisse se manter competitivo
sem recorrer a adiantamentos de receitas, seja junto a bancos, a federações ou
a emissoras de TV. Isto, você já sabe.
Praticamente livre de despesas bancárias, o clube desfruta dessa vantagem conquistada e monta elencos extremamente fortes. “Atraso no pagamento” é uma expressão que jogador do Palmeiras só ouve falar pelas notícias. O que há de melhor no mercado brasileiro hoje veste verde.
Claro, não somos a última bolacha do pacote. O talento inato
do jogador brasileiro permite que outros clubes também montem elencos com
jogadores de muita qualidade. As disputas pelo Brasileirão e principalmente pelos
mata-matas estão completamente abertas.
Mas a competição contra os grandes europeus no Mundial em
dezembro praticamente não existe. O que acontece é o cumprimento do protocolo.
Os times sul-americanos por vezes nem chegam à final e dependem de um jogo
encaixado, de um goleiro inspirado, do desdém do adversário e de muita sorte
para poderem levantar o Mundial. Se um clube top sul-americano jogar dez vezes
contra um campeão europeu, vai triunfar uma ou duas vezes, no máximo. E essa
inferioridade se reflete na seleção brasileira: antes temida, hoje é mera
coadjuvante na Copa do Mundo.
Os pilares da
transformação
São três os pilares em que os clubes brasileiros precisam se
apoiar para que nosso futebol torne a ser temido: 1) saúde financeira; 2) profissionalização
e modernização do departamento de futebol; e 3) departamento de base forte.
A saúde financeira
é algo que precisa ser buscado pelos endividados clubes às custas de medidas
recessivas. Enquanto os dirigentes insistirem em adiantar verbas em
contratações ruidosas, mas de pouca efetividade, em nome de sustentação
política, vão continuar como hamsters correndo na roda. O Palmeiras puxou a
fila de 2013 para cá e já vemos alguns clubes vindo na esteira – o principal
deles é o Flamengo. Os outros ainda seguem no ciclo vicioso de tomar
empréstimo, arriscar tudo em nome de um título e de uma premiação, para depois viver
anos de recessão, pagando juros. Com o tempo, tendem a aprender o modelo – alguns
sobreviverão e se fortalecerão, outros “virarão Portuguesa”.
A ciência proporcionou o aumento da capacidade física dos
atletas. Com jogadores que correm mais e ocupam melhor os espaços, o leque de possibilidades
táticas se abriu como nunca. O jogo, que há algumas décadas era simples e
decidido no talento por atletas que guardavam posição e se davam ao luxo de
serem fumantes(!), agora requer muito mais estudo e dedicação de comissões
técnicas e atletas, que precisam estar inseridos num ambiente cada vez mais moderno e profissional. E isso exige instalações
planejadas, equipamentos de ponta e profissionais capacitados. Mais uma vez, o
Verdão está na frente dos concorrentes, sobretudo depois da inauguração do Centro
de Excelência. Aguardem as cópias.
Sanar a economia e desenvolver a estrutura são passos fundamentais,
mas não trarão todos os resultados desejados se o terceiro pilar não estiver a
pleno: as categorias de base. E o
Palmeiras vem conquistando títulos como nunca nas categorias menores. Falta
ainda acertar a transição do sub-20 para o profissional, para que os meninos
que estejam perto de estourar a idade tenham condições de integrar o elenco
principal, coisa que ainda não acontece com a frequência que gostaríamos.
Base: não tem esse
nome à toa
As categorias de base são fundamentais à medida que fornecem matéria-prima para os dois outros pilares. Não é à toa que tem esse nome.
É em casa que se forma atletas de ponta, com fundamentos de
jogo desenvolvidos e com estrutura mental para suportar uma carreira de enorme
pressão como a de um jogador profissional.
Quando todos os principais clubes tiverem sanado suas
finanças e concluído suas estruturas, algo que é apenas questão de tempo, a
base será a diferença entre um clube protagonista e um coadjuvante.
Atletas extra-classe formados em casa podem subir para o
time principal, gerando ganho técnico a custo baixo, para posteriormente gerar
altos lucros com futuras transferências – como aconteceu com Gabriel Jesus.
Além disso, preenchem lacunas no elenco e evitam que o clube precise recorrer ao mercado para melhorar todas as posições, sobrando mais recursos para investir em necessidades específicas. Em vez de comprar 4 ou 5 jogadores nota 7 em nível mundial, será possível trazer um par de jogadores de primeiro nível. E assim o time sobe muito de patamar e passa a sonhar em bater de frente com as maiores potências mundiais.
Paramos no tempo
Os jogadores brasileiros, hoje, seguem tendo o talento
natural que brota nas ruas e nos campos de várzea, ainda que cada vez mais raros
diante do constante crescimento do setor imobiliário.
Enquanto o futebol ainda era decidido apenas pelo talento, o Brasil sobrava. Mas o jogo mudou e a profissionalização de todos os setores fez com que novas potências emergissem. Quem ficou parado no tempo, como Brasil, Argentina, Uruguai e Itália, foi ficando para trás. Quem diria que até a Inglaterra chegaria tão bem cotada ou até melhor que esses países para uma Copa do Mundo?
O talento natural precisa ser potencializado com novos
conceitos desenvolvidos nos últimos anos. Se todos os clubes brasileiros
profissionalizarem seus departamentos de base, colherão frutos. E isso surtirá
efeito também na seleção, já que voltaremos a ter jogadores que superem os
destaques dos outros países. Hoje, mesmo nossos melhores jogadores, não “engraxam
a chuteira” dos grandes expoentes da Copa do Mundo, que já são frutos de uma
geração desenvolvida com conceitos modernos de formação de atletas.
Nosso país ainda chora tragédias e tenta escrever leis para regulamentar os alojamentos dos departamentos de base. Estamos muito atrasados, no geral. O Palmeiras tenta, mais uma vez, puxar a fila.
Falta ainda ao Verdão melhorar o último passo: a lapidação dos meninos, que brilham nas categorias menores e levantam inúmeros troféus, para virarem jogadores de verdade. Se chegassem aos 20 anos realmente prontos, provavelmente seriam utilizados pelo time principal, mas isso ainda não acontece.
E depois?
Ter atletas da base no elenco principal não é apenas uma
questão de capricho, de gosto em ver um prata-da-casa brilhando. É uma questão
de competitividade. Precisamos de um Gabriel Jesus a cada dois ou três anos. Precisamos
de pelo menos dois Fernandos, todo ano.
A distância financeira entre o Palmeiras e os maiores clubes do mundo ainda é grande. Em 2018, estaríamos inseridos no top 30 mundial entre as maiores receitas, com quase € 160 milhões. Já conseguimos segurar um Dudu, que tem 27 anos, mas as ofertas por jovens de pouco mais de 20 anos ainda são impossíveis de cobrir.
Com a base funcionando a pleno, seremos capazes, no longo
prazo, de ter recursos para competir com os maiores até na questão dos
salários. O Palmeiras, em vez de ser a melhor vitrine, o trampolim mais alto para
um jogador chegar à Europa, pode passar a ser o objetivo final de carreira. E
aí bateremos de frente com qualquer um. É nessa direção que temos que remar.
É muito difícil, claro. Mas quem diria que estaríamos onde estamos hoje no final de 2012?
O Verdazzo é um projeto de independência da mídia tradicional patrocinado pela torcida do Palmeiras.