Baixada a poeira, é possível tratar um assunto delicado que
emergiu durante o fim-de-semana, mais precisamente aos 42 minutos do segundo
tempo do Derby em que o Palmeiras saiu derrotado, em casa.
Naquele momento, depois de um lance bastante enrolado em que
sofreu falta e foi atingido propositalmente na cabeça enquanto estava no solo,
pela passada de Richard, Deyverson acabou cuspindo no adversário e recebeu o
cartão vermelho. A falta era uma de nossas últimas chances de tentar ao menos
empatar o jogo e Deyverson foi mandado a campo exatamente para melhorar o
aproveitamento nas jogadas de bola aérea.
As reações da torcida no estádio e nas redes sociais, logo
após o fim do jogo, foram de desaprovação completa. As discussões passaram por
vários aspectos, desde o profissionalismo até o caráter do jogador – e as
palavras que surgiram não foram nada suaves.
Felipão, num primeiro momento da coletiva, tentou passar ao
largo da polêmica, alegando não saber a razão da expulsão. Os repórteres,
entretanto, trouxeram o motivo à tona e nosso treinador foi obrigado a reprovar
publicamente a atitude.
Um bom menino com o “chip
solto”
Cesar Greco/Ag.Palmeiras
Deyverson chegou ao Palmeiras em 2017, a pedido de Cuca.
Desde sua chegada, participou de 66 partidas e marcou 18 gols – uma marca
interessante, sobretudo para quem frequentemente participa de apenas parte dos jogos,
seja sendo substituído, seja saindo do banco.
Seu gol mais notável, claro, foi o marcado em São Januário,
que definiu a conquista do decacampeonato brasileiro. O feito já lhe garante um
lugar eterno no imaginário da torcida e uma espécie de gratidão infinita.
Deyverson é um rapaz que aparenta ter um coração de ouro. Um
bom menino. Já na coletiva de apresentação causou impacto ao se juntar ao pai e
chorarem juntos, tocados pela realização profissional enfim alcançada. No
dia-a-dia, com atitudes simples, cativa a todos na Academia de Futebol. É muito
querido, o chamado “bom de grupo”.
Na saída do jogo contra o Oeste, na quarta-feira,
questionado sobre um lance em que havia levado uma cotovelada, declarou orgulhosamente
que não reagiu porque estava mais focado em ajudar o Palmeiras – um discurso
talvez preparado para ser usado na primeira oportunidade, em resposta à fama de
ter o “chip solto”, termo ingenuamente cunhado por ele mesmo após mais um lance
enrolado na campanha do Brasileirão.
Colocando tudo na
balança…
Reuters
Deyverson está longe de figurar no rol dos maiores atacantes
da História do Palmeiras – bem longe. Mas seu estilo de jogo pode ser bastante
útil, sobretudo em partidas com determinadas características. Não poderia haver
momento mais específico para ilustrar essa possibilidade que os 5 minutos
finais do último Derby.
Seu comportamento em campo é errático e pouco confiável.
Alguém um dia pode lhe ter dito que ele irrita os adversários e que isso
poderia lhes render expulsões, e assim ele ajudaria seu time. Deyverson parece
ter gostado da ideia de ser o “bom malandro”. Mas exercer esse papel é uma arte
que exige absoluto auto-controle, o chip tem que estar absolutamente preso.
Deyverson não pode fazer esse papel enquanto não isso não acontecer.
Reprodução
Quem não adorou o lance da piscadinha, no Derby anterior, em
que ele foi substituído exatamente porque Felipão percebeu que o camisa 16
tinha saído completamente de controle? São os dois lados da mesma moeda que, agora
sem sombra de dúvida, não vale a pena.
Seu comportamento amalucado não é novidade: jogando pelo
Alavés, já havia acertado uma cusparada em Godín, do Atlético de Madrid, e
deixou todo o time colchonero absolutamente pistola, numa partida pelo
campeonato espanhol.
Por essa cuspida, deve ter sido muito questionado;
certamente percebeu que a atitude é inaceitável e se conscientizou de que
aquilo jamais poderia se repetir. Como se repetiu, deixa margem até para perigosos
julgamentos de caráter. Numa análise menos raivosa, no mínimo, fica em aberto a
completa incapacidade de se controlar para não repetir atos deploráveis de
forma impensada.
Hora da sabedoria
Fernando Dantas/Gazeta Press
Deyverson foi contratado pelo que faz com a bola, mesmo com suas limitações, e não por suas atuações como desestabilizador de adversários. O lance no Derby pode ter sido a prova definitiva de que, mesmo mostrando consciência disso, Deyverson carece demais de maturidade, não é confiável e seu ciclo no Palmeiras precisa ser encerrado. O chip está irremediavelmente solto, não há o que fazer.
É preciso executar a decisão com sabedoria. Ninguém quer prejudicar sua carreira mais do que ele mesmo já o faz. E ninguém quer rasgar dinheiro, desvalorizando um ativo do clube. A saída de Deyverson precisa ser conduzida da forma mais discreta possível, e o Palmeiras tem um enorme trunfo na Academia de Futebol para ajudar nesse processo: Arthur Cabral.
O camisa 39, que se recupera de uma lesão no púbis e está
fazendo um trabalho específico de fortalecimento para não sentir o problema
durante a temporada, reúne mais recursos técnicos e físicos que Deyverson. É
bem possível que, mesmo se seu comportamento fosse exemplar, Deyverson perdesse
espaço no elenco naturalmente com a ascensão do centroavante que veio do Ceará.
Episódios como o do último sábado apenas aceleram o processo, e de forma
ruidosa.
É esse ruído que o Palmeiras precisa evitar. O tempo vai passar e os assuntos mudam. Deyverson aos poucos vai saindo da pauta até que Alexandre Mattos consiga uma boa resolução para o problema. Infelizmente, essa será a impressão final que, ao que parece, o garoto vai deixar.
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